terça-feira, 19 de março de 2013


A MENINA QUE NÃO CONHECIA NÚMEROS

Recordo-me  saudosamente da menina de olhos claros , cabelos loiros despenteados e pé no chão. A pele morena do sol revelava a infância vivida na hoje grande avenida e antiga estrada de terra . Olhar melancólico de quem mesmo não sabendo contar percebia no andar acelerado da mãe e nas palmas batidas nas  cercanias , que os números expressos nas notas do cruzeiro conquistado  , não eram o suficiente pra comprar  o pão. A garota  franzina  nada pedia , acreditando assim aliviar o sofrimento da protetora  desejosa da alegria de sua cria. Eram quatro , a mais velha já sabia contar e protestava a precisão , a do meio , inteligência divina..como pode tudo saber? Bastava perguntar que estava pronta a responder . O menino atrapalhado e nervoso corria atrás de pipas voadoras e nada obtinha ; até dispor-se a assustar velinhas  e crianças que procuravam o que fazer. Criativo demais , mas atentado!!!.Diziam as pessoas. A menina de pele queimada era a menor e  aos olhos dos grandes a menos sabida. Ah..essa se estudar até a quinta série já está bom demais.Quem sabe se forçarmos até oitava!!Dizia a família ao olhar para menina espevitada .  Mas ao olhar para o céu percebia que o papagaio que tanto o irmão queria estava prestes a voar e a menina corria até alcançar..todos papagaios do ar que acabara por doar.  Ao observar a mãe agitada ; com lápis e papel de pão na mão ; o olhar ingênuo pode sentir a infinidade  de números. Sem o menor entendimento de cálculos sancionou  que a conta era de subtração. Sendo subtrair ; equivalente a diminuir a alegria de alguém . Desta vez a mãe estava sorrindo aliviada ;  dizendo:  _“Benzadeus” ; essa árvore  está lotado de frutas ; teremos muitos abacates pra comer . Assim era...abacate com limão; vitamina de abacate ; abacate na salada ; geladinho de abacate. .A franzina um dia acordou cedo , esperou a mãe sair , pegou o carrinho de mão de serviços do pai...e seguiu sem rumo. Assim fez , em vários dias sem que ninguém percebesse sua ausência , ia e voltava pra casa. Na rua , com um jeitinho doce divulgava a venda. As vezes homens adultos lhe faziam  gracinhas , porém quando percebia fechava seu sorriso e corria..para perto de alguma mulher. Sabia que a vida tem perigos e sentia o cheiro do mal quando se aproximava. _ Entre!!! Dizia um homem com ar de bonzinho. Tenho uma caixa de chocolates que guardo para as crianças quando passam por aqui. Venha vou te dar duas pois é uma linda garota.  A pequena chegou a salivar em pensar que estava sem se alimentar. Mas resistiu ..pois o cheiro que sentia ; era o cheiro da maldade.

Ao entardecer ; lá estava a mãe aflita ; contava as moedas e abria o armário ..vasculhando. A pequena que de números não compreendia  ,revela a mãe o resultado de suas aventuras de menina não sabida. A senhora assustada com rigor quis saber de onde vinha tais cruzeiros que tanto precisava. Antes mesmo da moleca  responder  , a mulher se apavorava  dizendo que filha dela não roubava e que não poderia crer.

A  garota sem malícia  com os olhos brilhantes e sorriso no rosto ; mostrou  a mãe um lindo e redondo abacate e dizendo-lhe “ Veja !!São lindos e saborosos. É uma espécie rara de abacate . Apenas dois por Cr$ 2,00 . ”

A mãe feliz abraçou a filha..nesse momento a espevitada sentiu-se a criança mais amada e sabida...que já começara a aprender a contar.  

Como teve essa ideia pequena menina !?

- Quando faço silêncio e fecho os olhos , ouço meu coração bater como um musica e algumas imagens ficam flutuando em minha mente como bolas de sabão e aos  poucos elas vão se encaixando umas a outras e me indicam o que devo fazer .

( Márcia Regina Figueira)